Foto: Marcos Corrêa/PR
1. O conjunto dos fatos ocorridos no dia 22 de maio – a divulgação por ordem do Ministro do STF Celso de Mello do vídeo da reunião ministerial do governo Bolsonaro, a decisão do mesmo Ministro Celso de Melo em dar andamento às investigações sobre Bolsonaro e a nota do General Heleno chefe do GSI – ampliam a tensão na disputa pelo fim do governo Bolsonaro.
2. Ainda que os conteúdos das diversas intervenções de Bolsonaro, expostas no vídeo veiculado, possa manter organizada a extrema direita, até mesmo ampliar sua unidade e seu radicalismo, a exposição de determinados conteúdos fragiliza o apoio ao governo entre setores conservadores, mas moderados, da centro direita.
3. A caracterização de que nesta reunião tenham sido cometidos crimes de responsabilidade estará em disputa nos próximos dias, mas é incontroverso o fato de que os elementos políticos expostos ampliam as dificuldades do governo Bolsonaro em garantir a estabilidade para o “mercado” financeiro. Os ataques ao PSDB, aos governadores, prefeitos, STF, Congresso, são antes de mais nada, ataques às frações das classes dominantes. E isto pode custar caro para Bolsonaro e sua turba fascista.
4. O quadro é de disputa notória, inclusive no campo da direita. Nada está determinado e o quadro do Governo Bolsonaro é de deterioração, ainda que parcial, e não de acumulação. Se é verdade que Bolsonaro agrupa e organiza um campo político de extrema direita, antes irrelevante, também é verdade que se desconstitui em outras relações políticas, inclusive internacionais.
5. Temas relevantes no arranjo de forças do sistema mundial, como direitos humanos e preservação ambiental em especial da região amazônica, além de suas posições anti-iluministas e exóticas no enfrentamento da pandemia, desacreditam o governo perante os organismos internacionais, o que significa dizer perante os centros e instituições financeiras globais.
6. A garantia de execução do programa neoliberal tem sido uma condição necessária para a sustentação de Bolsonaro. Ainda que grande parte da sustentação de Bolsonaro não seja exógena, o rompimento ou distanciamento com o rentismo pode ferir de morte a sustentação do governo e desarticular o bloco de classes no poder.
7. Pode ter iniciado, de forma mais aguda, um deslocamento de forças da centro direita em sentido contrário ao governo. Ainda que as forças mais autoritárias iniciam um flerte mais explícito com o auto golpe, como parece indicar a nota do general Heleno, organizar a direita extremada e fascista pode não ser suficiente para manter coeso o bloco no poder.
8. A opinião pública não é um sujeito político, é uma expressão da ação dos sujeitos políticos. É uma esfera da política que expressa os movimentos dos diferentes grupos da mídia, das igrejas, do Estado, dos partidos, dos aparelhos privados de influência nas redes sociais etc. Há um conjunto de sujeitos em luta, cujos mais fortes estão no campo da direita e do neoliberalismo, obviamente em disputa para obter a supremacia na relação política. O que para um campo político tão dependente do apoio da opinião pública, não é positivo. A legitimação política é fundamental para a sustentação do governo e ela fica agravada quando se expõe o fato de que as pautas do governo não são causas universais, como a saúde da população e o combate à pandemia (hoje o Brasil ultrapassou a marca de 21 mil mortos) ou a manutenção dos empregos e postos de trabalho, mas anticomunismo, aborto e destruição ilegal da Amazônia. Isto ainda tem seu peso, mesmo que reconheçamos que o eixo dos valores tenha se deslocado para a direita no último período.
9. O Governo Bolsonaro vem se enfraquecendo, porém é preciso reconhecer que ainda retém força suficiente para sustentar-se momentaneamente. O acordo com o “centrão” talvez seja o mais importante movimento neste sentido.
10. A situação está longe de se resolver mas a condição do governo Bolsonaro está bem mais deteriorada do que antes destes episódios. Contudo, o debate não será jurídico e sim político. A esquerda joga um papel esperado de oposição e denúncia e poderá crescer em relevância por ter sido um contrapondo à Bolsonaro desde o início. Mas o fator decisivo deverá ser a movimentação do capital financeiro e da centro-direita pela substituição de Bolsonaro por outro governo.
* Publicado originalmente no Sul 21.
Edição: Marco Weissheimer
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